quinta-feira, 21 de maio de 2009

MATRIX E O CAPITALISMO

No meu ponto de vista, o primeiro filme “Matrix” é um rico apanhado de críticas e denúncias sutis à vida ilusória e escrava que todos nós levamos neste mundo dominado pelo capitalismo, ou mais precisamente, pela cultura capitalística. Lembrarei algumas passagens do mesmo, dando-me o direito de imprimir, aqui e ali, o meu juízo de valor, para que, quem assim desejar, possa buscar uma reflexão na analogia.

No filme, exceto alguns homens e mulheres rebelados e livres, todos os demais vivem em cativeiro, desde o nascimento até a morte, dentro de uma redoma individual, em sono permanente, encobertos de líquido gelatinoso e fios condutores ligados em todo o corpo sugando suas energias. Há um cabo central, acoplado à nuca de cada um, transmitindo informações sensitivas diretamente ao cérebro, a partir de um programa central - a chamada Matrix - dando a falsa impressão de que se vive uma vida normal, quando, na verdade, tudo não passa de uma simulação virtual.

Este é o mundo dominado pelas máquinas que, há duzentos anos, alcançando inteligência própria, disputaram o poder com a raça humana e venceram, desde então “cultivando” os homens para lhes servirem como pilhas abastecedoras, até o esgotamento e descarte.

A história gira em torno do personagem chamado Neo que é um comportado funcionário de empresa mas que, nas horas livres, é hacker viajando ilegalmente pelo mundo da virtualidade.

Neo sente algo muito estranho em sua vida e ao seu redor, como se tudo não passasse de um sonho. Na realidade, tal como quase todos os demais seres humanos, ele também está preso e escravizado mental e corporalmente pelas máquinas. Mas ao contrário de todos, tem a intuição acima que lhe traz desconforto e conflito interno contínuo.

Por conta disso, uma pessoa chamada Morpheus - outro importante personagem do filme - aparece em sua vida de forma inusitada propondo-lhe dar respostas às suas dúvidas e incertezas. Morpheus é um dos poucos homens que se libertaram da Matrix. Respeitado líder de um grupo de insurgentes que vêm procurando, há anos, o Escolhido, que conforme a profecia do “Oráculo” (um ser místico, disfarçado de dona de casa, escondido dentro do programa Matrix) viria para salvar o mundo. Morpheus acredita profundamente que Neo é esse Escolhido.

O primeiro contato pessoal entre Neo e Morpheus se dá com o acesso deste último ao mundo virtual através de um programa paralelo desenvolvido em sua nave (chamada “Nabucodonossor”). Na conversa, Morpheus mostra a Neo a realidade do mundo em que os seres humanos vivem (ou melhor, “vegetam”), escondida por trás da fachada criada pelo programa virtual: um lugar deserto, frio, em ruínas, encoberto de espessas nuvens cinzentas eletromagnéticas, vigiado por máquinas voadoras (os “sentinelas”). Isto é o que sobrou da Terra, destruída há dois séculos.

É duro para Neo aceitar ou acreditar, apesar de todas as evidências explícitas, nesta realidade e no fato de que a sua existência tem sido uma mera mentira, uma simulação, uma história fabricada. Ele tenta fugir, mas já é tarde: terá que necessariamente fazer a escolha por ingerir a pílula vermelha ou a pílula azul.

A pílula vermelha era aquela que lhe provocaria uma convulsão no seu corpo verdadeiro, capaz de fazê-lo acordar do sono inserindo-o, pela primeira vez, no mundo real, no mundo da consciência. A pílula azul faria-o esquecer de tudo o que ele até ali passou e descobriu, levando-o de volta à sua vida virtual de funcionário de empresa e comportado cidadão. Ambas as opções seriam uma decisão sem retorno.

Neo escolheu a pílula vermelha. Após ingeri-la, acaba por acordar confirmando estar dentro da redoma gelatinosa. Logo, uma máquina supervisora detecta a irregularidade, a “anomalia” e Neo, considerado como uma espécie de fruta apodrecida, é jogado ao esgoto, sendo após resgatado pelos companheiros insurgentes.

Desde então, começa a sua lenta adaptação física à vida real. “Por que meus olhos doem?”, pergunta a Morpheus, que o responde: “porque você nunca os utilizou”. A seguir começa o seu criterioso preparo mental para o retorno ao mundo virtual e o combate, sobretudo, contra os chamados “agentes”: homens de preto, frios, calculistas, muito ágeis e fortes, na verdade o anti-vírus criados pelas máquinas para proteger o seu programa Matrix.

Esta preparação de Neo consiste em desenvolver a sua capacidade de abstração da realidade, ou seja, compreender que a realidade visível, ou melhor, sensitiva, no mundo virtual não passa de uma mera aparência forjada pelo programa e que, por isso, pode ser controlada e manipulada, enfim, dominada por quem conseguir desmistificá-la por completo.

O desafio se faz muito difícil para Neo, pois não lhe basta o aprendizado de inúmeras técnicas de defesa e ataque (inseridas virtualmente na sua mente mediante outro programa desenvolvido pelos insurgentes) contra os agentes. É preciso, sobretudo, a concentração e o esvaziamento total de todos os valores enraizados no seu interior durante o seu cativeiro, para que a mente esteja absolutamente livre e capaz de ser ativada da forma correta e profunda.

Neo questiona se lhe será possível alcançar tamanha agilidade dentro do Matrix para, por exemplo, desviar, como fazem os agentes, das balas de metralhadora. Morpheus responde que a sua missão é levá-lo apenas até a porta. Terá que ser ele (Neo) sozinho, enquanto o Escolhido, a seguir adiante. Deverá alcançar um patamar de controle do programa que já não seja mais necessário sequer se movimentar para evitar ser alvejado.

É o que acaba por acontecer no final do filme quando os agentes atiram em Neo e ele pára as balas com uma das mãos e entra no corpo de um dos vilãos, explodindo-o. Os outros dois, vendo isto, fogem. Mas antes, em cena anterior, Neo é morto em confronto armado com os mesmos, o que resultaria também na sua morte real (já que a mente aniquilada no mundo virtual provocava concomitantemente a morte do corpo real). Mas, para a surpresa dos agentes e da tripulação insurgente que acompanhava a disputa pela tela dos computadores da nave, Neo ressuscita no mundo real e, por conseqüência, no mundo virtual: um fato inédito e que comprova ser ele realmente o Escolhido.

Já passada a primeira vitória, uma provocação direta às máquinas é então feita pelo Escolhido, através de telefone, no mundo virtual (o telefone é o veículo de transposição dos rebeldes entre o mundo real - a nave e o mundo virtual – o programa Matrix): que, pela primeira vez, elas também estão a sentir o medo da morte ou de voltar a serem dominadas pelos homens, seus originários criadores. Tudo porque uma ameaça real, um vírus forte e poderoso - ele mesmo: Neo - entrou no seu programa Matrix o que poderá, através disso, inclusive - e aqui a provocação se faz uma ameaça - infectar e danificar todos os demais programas em rede que lhes dão vida e autonomia.

As máquinas se preparam para a guerra. Segue a triologia.

Texto escrito por RINALDO MARTINS DE OLIVEIRA
Em 2 de março de 2008.

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